Nunca mais volto
*A mangueira do bombeiro
Antunes Ferreira
Responsável fora o Santo António que até tinha estátua em Lisboa. Do seu casamento? Pois sim, o virtuoso também ajudara ainda que fora a Câmara Municipal quem mexera os cordelinhos. Já iam uns largos anos e para a concretização da ideia que nascera duma proposta apresentada em sessão mensal pelo vereador Augusto Pinto. Em 15 de Abril de 1958, o Diário Popular anunciava o evento, e declarava-se empenhado em "congregar esforços no sentido de se dar realização a essa tão bela ideia de promover o casamento de jovens dos bairros populares na manhã de Santo António."
Nesse ano de 1958, e nos seguintes, este jornal (entretanto desaparecido, como os restantes nocturnos) foi fundamental para viabilizar a iniciativa do casamento coletivo, mobilizando a sociedade civil, criando uma onda de simpatia, captando e noticiando apoios de particulares, estabelecimentos e marcas comerciais.
A angariação de padrinhos, de automóveis para transporte dos
noivos, os vestidos e ramos das noivas, os penteados, os fatos e os sapatos dos
noivos, as alianças, os produtos para a boda, a lua de mel, e até mesmo o
fundamental para um início de vida: cursos de formação, mobílias,
eletrodomésticos, bens de primeira necessidade. Em algumas edições, e mediante
sorteio, apartamentos.
A
cadência quase diária com que nas páginas do jornal se iam
somando os apoios, e que culminava com a grande reportagem do dia da cerimónia,
"grande acontecimento citadino", em que era consumado o "sonho
de raparigas pobres, honestas, boas filhas e boas irmãs", "devido à
generosa ternura dos nossos leitores", dá bem o tom de "uma ideia
admirável em marcha".
O seu casamento, com ou sem o santo a tutelá-lo, dera com os burrinhos
na água, o facto de ser sapador bombeiro fora a gota de água que fizer
transbordar o copo. O seu Regimento era o de Benfica onde ficava situada a 4.ª
Companhia. Os incêndios não eram consultórios médicos: não eram necessárias
marcações. Além disso tinham um hábito horrível – em grande parte aconteciam à
noite.
Maria Clara no inicio da vida conjugal era toda sorrisos,
dengosa, terna, boa – na lida doméstica e, principalmente, na cama – amável
solicita, excelente cozinheira (como prenda do dia do casório até lhe comprara
n Barateira o Livro de Pantagruel); porém tinham sido efémeros uns três, mesmo quatro nos. Uma
noite fatídica, um desenvolvimento macabro, um final abracadrabrizante!
Houvera o incêndio nas instalações da imobiliária A CASA
É SUA que ocupavam três andares dum
prédio de doze Alta de Lisboa e dada a dimensão do fogo (que já se alastrava
quase a todo o imóvel) todos o regimentos dos Sapadores tinham sido mobilizados
para dar combate o mais eficaz possível às chamas.
Inclusive vieram os
Voluntários do Lumiar e da Ajuda. No meio das mangueiras, escadas Magirus,
jipes de comando, ambulâncias do INEM, veículos do SMV, da PSP, da Proteção
Civil, podiam encontrar-se responsáveis da empresa enquanto eram assistidos
muitos moradores dos restantes apartamentos do prédio. Bom bombeiro, o Justino Domingues
Ferrão estava no seu elemento – contentíssimo.
Mas quando chegou a casa (eram umas cinco da matina) e se
preparava para comer alguma coisa foi direito à cozinha para vistoriar o
frigorifico encontrou em cima da mesa um envelope que lhe era dirigido.
Reconheceu a letra da cara-metade e abriu-o logo. Dentro jazia um papelinho que
rezava só a vermelho
FUI APAGAR OUTRO FOGO
NOUTRA FREGUESIA. NÃO CONTES COMIGO, PODES ENROLAR A MANGUEIRA. NUNCA MAIS
VOLTO.
.
Guerras Energéticas - A Bomba Relógio Russa VII:
ResponderEliminarhttps://portugueseman.blogspot.com/2022/11/guerras-energeticas-bomba-relogio-russa.html
No cpmments
EliminarHenrique
Ó Henrique, então não poderias ter arranjado um final mais airoso para o abnegado soldado da paz? Coitado!
ResponderEliminarDepois de uma descrição tão pormenorizada, sobre o início dos casórios de Santo António, sob a tutela da Câmara Municipal e o bendito patrocínio do Diário Popular, ilustrado a preceito, pensei que a coisa não descambasse para o torto e a mangueira do bombeiro continuásse no activo.
E, para terminar, agora sou eu que te canto o fado da Maria Clara:
Não sonhes Maria Clara
que pode tornar-se escuro
a alegria do teu rumo
e toda a tua ventura ___
___amanhã pode ser fumo.
Gostasti?
Beijocas e muita Saúde, para todos os Antunes.
Minha querida Janitamiga
EliminarTal tá a moenga!
Coitada da Maria Clara? Essa agora?! As bombas não têm regime de exclusividade portanto há que aguentar e bico (mais ou menos) caladinho. Isso de recorrer a "envelópio" já deu o pio porque nestes transes ou se é ou se não é e o resto é paisagem. Porra! Escrevi isto tudo - e não disse nada...
Por isso (e como não tenho mangueira - honny soit - para enrolar ou desenrolar) por aqui me ou com muitos
beijos & queijos
Henrique
/sem emojis porque não estou virado p'ra eles)
Como ela escrevia também parecia um bocadinho Bombeira
ResponderEliminarum beijinho e uma boa semana
Querida Redondinhamiga
EliminarBombeira, bombeira, não faças asneira...
Beijo & queijo
Henrique
Só tu mesmo....Pobre homem e que final à sua mangueira de bombeiro,rs...abraços, chica
ResponderEliminarChiquinha do meu coração
EliminarBombeiro só há um - o Justino e mais nenhum!!!!
Beijos & queijos
Henriquinho
Chiquititicamiga
EliminarBombeiro, bombeiro só há um - o Justino e mais nenhum!
Beijo & queijo
Riquinho
Eu até pensava que essa tradição fosse mais antiga, que a fama de casamenteiro já leva séculos, se pensarmos que antes de ser santo, Fernando de Bulhões nascido em 1195, até estudou em Coimbra, acabando por falecer em Pádua em 1231, ou seja alguém com muita prática para juntar caras metades!
ResponderEliminarEntão e o Santo António que fazia nesses dias, não cuidava dos noivos que tinha ajudado a compor? e ainda deixou alastrar um fogo dos infernos que não parou enquanto não desfez a aliança com promessa de eternidade
isso não se faz!
Minha querida Ângelamiga
EliminarEsta questão dos Antónios relacionados com a nossa capital tem muitas implicações, a maior parte das quais suscitavam anedotas e ditos durante o malogrado “Estado Novo”. Uma das mais interessantes é a quadra qu aqui deixo:
!Dos dois Antónios
De que Lisboa disfruta
Um é filho da Sé
O outro é filho da pu…, ups, não é!”
Rima e é verdade… Quanto às tricas entre Lisboa e Pádua elas são mais velhas do que o Matusalém. Que fique cada um com a sua; por mim renego a função pilatesiana, porque hoje já lavei três vezes as mãos…
Bisous & fromages
Henrique (Henry)
Henrique, prezado amigo,
ResponderEliminarSempre vinha neste espaço
A procurar algum traço
Do novo e via o antigo
Estático, então, te digo
Que eu me sentia triste
Com texto que não existe
Alem de preocupado
Por falto do fiel soldado
Que à retaguarda assiste.
Parabéns pela volta triunfal e pela rica matéria. Abraços fraternos. Laerte.
Caro Laertamigo
EliminarP’ra poeta não nasci
Só na prosa é que me safo
As coisas que já vivi
Resumem-se num abraço
Mas tu vens acordar
Algumas recordações
Abrindo de par em par
Muitas mais desilusões
Por aqui me quedo ou fico
Antes que a rima m’afogue
Mais pobre do que rico
Irei mais ao teu belo blogue!
Quem diria, mas com um esforço impensável e inaudito obrigaste-me a rimalhar – mesmo sem mangueira…
Abração do
Henrique, o anti-poeta
Coitado do Henrique!!! Ficou sozinho...apenas com a companhia dos fogos...
ResponderEliminarObrigada pela visita
Beijos e abraços
Marta
Querida Martinhamiga
EliminarDiz o ditado popular que #mais vale só do que etc... Quanto a fogos, já me constou que o Justino vai até à Costa Rica para tentar apagar as labaredas ateadas pela "La Roja" no Qatar- 7-0 é muita chama - de golos!!!!!
Beijos & queijos💋💋💋🙌🙌🙌
Enrique (Com H)
Já me faltavam estes textos com humor à mistura. Foi um gosto lê-lo, meu Amigo.
ResponderEliminarUma boa semana com muita saúde.
Um beijo.
Minha queridíssima Gracinhamiga
EliminarNão me posso aguentar: estou de novo deslumbrado com a tua presença aqui neste lugar que também é teu. E penso que devo recordar que como excelentes Amigo que eramos, somos e continuaremos a ser, já os tratávamos por TU. Espero e DESEJO que assim continue; a minha Raquel concorda - não tem ciúmes pois sabe que nunca a enganei1
Fico aguardando os teus poemas. Já to isse milhentas vezes - mas não me canso de repetir: és a POESIA VIVA. Muito obrigado.
Beijão
Henrique
Como é bom começar o dia com a boa disposição que é teu apanágio!
ResponderEliminarE fui atrás do tempo e " vi "ainda os casamentos de Santo António
Uma boa semanam
Um beijo
Olá Manelinhamiga
EliminarTive uma criada (hoje uma "empregada doméstica") que foi uma "noiva de Santo António" Ele era ajudante (moço de recados) do dono da mercearia da minha Rua Filipe da Mata onde a minha mãe era cliente de apontamentos e pagamento mensal.
Eu tinha seis anos e não percebi o motivo por que a menina Elvira levou para o altar uma barriga bem redondinha. Será que comia muita feijoada ou o namorado (que era dos voluntários de Campo de Ourique) levava a mangueira quando se encontrava com ela? Ninguém me esclareceu.
Até a Dona Glória, minha mãe, me avisou: "Riquinho. se voltas a falar no assunto levas com a colher de pau!!! Fora isso, os casamentos correram muito bem e até comi dois esquimós fresquinhos,
Beijinhos & queijinhos😜😆❤
Henrique
Olá, olá. Como tem passado? À quanto tempo, hein?
ResponderEliminarGostei da publicação. resumido. O Bombeiro quando apaga muitos fogos ao mesmo tempo algum fica mal apagado :))
Muita saúde para si. Obrigada pela visita ao meu "coisas" 🙏
.
Beijo e uma excelente semana...
Cidáliamiga
EliminarP'stá claro como vinho tinto; o reencontro é sempre motivo para reencanto. E no caso de "velhos" amigos (eu vou nos 81 sem descontos...) é, naturalmente, maior a alegria de nos (re)vermos. Temos de continuar a trocar visitas e comentários. Concordas? Tenho a certeza de que sim! E não será preciso chamar os bombeiros...
Beijo & queijo💋💋💋
Henrique
Que bom que voltou, amigo. E muito obrigada pela anedota que deixou no Sexta.
ResponderEliminarAdorei esta história. Já tinha saudades destes textos tão cheios de humor.
Abraço e saúde
Querida Elviramiga
EliminarAntes do mais um grande xi-coração de agradecimento pelas amáveis palavras que me dirigiste. É sempre bom para quem tem por oficio a escrita e além disso d´um valente empurrão ao ego...
E por hoje é tudo.
Beijo & queijo
Henrique
Provavelmente a mangueira do bombeiro, com tanto uso, começava a acusar algum desgaste.
ResponderEliminarTerminou à mesa de uma secretária!
Abraço
Viva Rositamiga
EliminarPor mal dos meus pecados o Justino não é meu confidente, donde não sei nada sobre a mangueira ele - nem quero saber. Para mim já basta o que basta no que concerne a fogos, fogueiras, fogachos, incêndios, fósforos, amorfos, isqueiros extintores, mangueiras, ambulâncias e quejandos.
Na minha secretária de madeira (antiga) estão o computador, o teclado, uma impressora e uma porrada de livros, papeis avulsos e até o "Prontuário Ortográfico" *Guia da Línjua Portuguesa 50.ª Edição da autoria de Magnus Bergström e Neves Reis NOVA EDIÇÃO ATUALIZADA conforme o Acordo Ortográfico (que eu não sigo). Mas nenhuma mangueira mesmo que enrolada...
Beijo & queijo
Henrique
Obrigada pelo comentário e visitinha .
ResponderEliminarSeus textos sempre com um humor que necessitamos.
Que venham muitos outros, não se demore.
abraços e bons dias
Ora viva Lisamiga
EliminarAgradecer as tuas simpáticas palavras não é um dever - é uma obrigação que cumpro com o maior prazer. Depois da paragem sinistra de três anos e picos (recaída da bipolar + Covid) tenho vindo a escrevinhar a 198,7% à hora, pelo que estão acumulados nas gavetas da minha secretária desde os finais de Outubro 27 novos testti..., ups, textículos que irão sair a conta-gotas. E por agora é tudo.
Beijos & queijos
Henrique
Mais uma boa. Raul do Polo Norte
ResponderEliminarÓ Raul
ResponderEliminarDestes "anormais", digo, anónimos, gosto. Aproveita e vê se me mandas umas grades de Bushmills da loja do Pai Natal que fica a 27º do Polo Norte. É uma ORDEM!!!!!!!
Abração do
Riquinho
Vi que voltou à lides blogueiras e vim visitá-lo.
ResponderEliminarE em boa hora, já que os seus textos são imperdíveis.
Continuação de boa semana, caro Henrique.
Abraço.
Caríssimo Jaimamigo
EliminarHá quanto tempo não nos encontrávamos! Por minha culpa é certo; ou melhor por mor da recaída da bipolar + Covid. Mas, para já um grande, grade, grande obrigado!
Abração
Henrique
PS: o sapador que mantenha a calma, só há 91 homens para cada 100 mulheres. Portanto, sobram 9, é só escolher um novo quartel onde haja incêndio para apagar...
ResponderEliminarJaimissimo
ResponderEliminarGostei, Eu seja ceguinho, mas essa da percentagem caiu-me no goto. Boa malha! Repito: GOSTEI!!!!!
+ um abração
Henrique
Depois de tantos anos a vê-los encarniçados, em encarnados carros, fiquei a saber que há bombeiros que o não são.
ResponderEliminarFalta ou defeito de material? Ou desgoverno.
Abraço.