O mistério da escada
do Cintra
Antunes
Ferreira
Corria Antunes
Ferreira o ano de 1957 quando nasceu um pimpolho ao casal Sintra que vivia na
Musgueira. Os pais, não sendo católicos praticantes, decidiram batiza-lo. A
cerimónia ocorreu na igreja de São João. Aquando da água benta, todos os
assistentes, excluindo naturalmente o neófilo, deram-se conta de alguma
indecisão do prior da paróquia. Adiante.
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Pia baptismal |
Como era habitual, o
registo religioso decorreu na sacristia e aí se deram conta os presentes que o
digno sacerdote teria abusado do vinho
de missa. Eu bem dia que ali havia coisa segredo na coisa, sussurrou a Hermínia
peixeira na praça da Ribeira ao ouvido da Irene vendedora de roupas num estabelecimento
da Baixa que a mandou calar.
Desta feita foi o sacristão Maurício que
procedeu ao registo. Ora Maurício tinha apenas a segunda classe sem qualquer
especialidade, e ali começou a saga do nome do crianço. Pais e padrinhos
apuseram o dedo na página por ambos serem analfabrutos; o puto nada apôs,
apenas berrava como uma vitela desmamada. O nome escolhido era Xavier Carvalho
Sintra.
E o sacristão, cuidadosamente para não haver
rasuras no documento, escrevinhou Chavier Cravalho Cinta. E foi um par por um
olho, podia ser pior quanto ao primeiro apelido que podia ter originado
comentários mês conformes aos bons costumes. Ele há coisas que por aí correm e
o que não faltam são maliciosas
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Esticadores para os colarinhos |
Aos seis anos via-se
que o gaiato tinha queda para os negócios: vendia esticadores para os
colarinhos e atacadores para sapatos e botas, na esquina dos Restauradores com
a rua do Regedor. Um ano depois era ardina, etc. Faz o autor um
hiato para não cansar os leitores (ainda os haverá?) Assim vamos encontra-lo
como grume no hotel Avis onde vivia o Senhor Gulbenkian. Tinha 15 aninhos.
Aconteceu que o doutor
Perdigão achou piada ao gajo e levou-o para a Fundação que entretanto fora
criada. Chavier com ch decidiu pelo estudo nocturno na Veiga Beirão donde
passou para o Instituto Comercial e para o Instituto Superior de Enconomia e Finanças;
terminou com um 16, uma nota excelente. Era doutor.
Entretanto disse adeus ao presidente e abriu um escritório próprio para assuntos do seu ramo. Depois foi papelaria e mais umas quantas, transportes de toda a espécie, hotéis e restaurantes, turismo e quejandos. Em suma, milionatizou. Construiu um império multiempresarial.
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Um império multiempresarial |
Entretanto disse adeus ao presidente e abriu um escritório próprio para assuntos do seu ramo. Depois foi papelaria e mais umas quantas, transportes de toda a espécie, hotéis e restaurantes, turismo e quejandos. Em suma, milionatizou. Construiu um império multiempresarial.
Vai daí casou com a Maria
Alzira Silva que para não destoar tirou as Novas Oportunidades. Ainda foi para
a faculdade, mas no segundo ano desistiu. Estava farta de compêndios e livros. Tiveram
dois filhos e uma filha, malta fixe, cena porreira. Do andar nas Avenidas Novas
passaram para uma moradia,
na Alta de Lisboa, três andares, a cave ginásio
fitness duas piscinas, uma com água quente para o Inverno, sauna e minudências
diversas e outras vivendas uma na Aroeira, outra no Algarve. Estava como
queria.
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Moradia Chavier |
Todos os milionários
têm uma ou mais gajas. Obviamente o Senhor Doutor Chavier com ch tinha uma a
Lurdes, Luluzinha, a quem pôs um andar de cinco assoalhas no Restelo e outras
mordomias consentâneas com o seu estatuto. Visitava-a todas as quartas e sextas
pois tinha horário nocturno por mor do muito trabalho. A Alzira que no entretanto
passara a ser a Senhora Doutora Dona Alzira, que não acreditava nem um biquinho
nas justificações do querido esposo, também arranjou um namorido que era o jardineiro
dos jardins do palacete e por singular coincidência se chamava Xavier mas com x
e sempre ficava mais à mão de semear. Uma felicidade perene.
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Dois degraus da escadaria |
Mas, inopinadamente
aconteceu um drama, uma grande chatice, não há rosas sem espinhos. Quando ia a
entrar no seu Rolls Royce para ir para o escritório, o mordomo Serafim veio
comunicar ao Senhor doutor Chavier com ch que durante a noite, sem ninguém dar
conta e com o alarme desligado tinham
desaparecido dois degraus da escadaria em lioz mais branco e puro que dava do rés-do-chão
ao terceiro andar. Porra! Que merda vem a ser esta, tantos cuidados e ninguém dá
conta desta sacanice. Se apanho o filho da puta agarro-o pelos colhões e adjacente
e dou-lhe uma carga de porrada, que o fodo! Se me der na veneta até o capo!
O Senhor Doutor Chavier
com ch era adepto da trampa, ops, do Trump e para acrescentar, quando jovem
tinha andado pelo Cais do Sodré com elas, como as iscas e pelo Intendente e
pela feira popular, ó jeitoso dá (-e) um tiririnho, por vezes lembrava-se do
linguajar mais desbocado. Porém o pior ainda estava para vir. Três noites
depois tinham-se sumido mais quatro degraus: Pêjota ao barulho.
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Com a águia vitória II |
Esta descobriu que o
bandalho que roubava os degraus era o Xavier com x que era benfiquista dos que
até cantam as papoilas saltitantes do
falecido Piçarra. Andava a juntar os degraus em lioz para substituir na estátua
do Marquês este com o leão pelo Orelhas com a águia. Se fosse a águia II tudo
bem; mas o emblema do Benfas, vá lá, também servia.
Pelo contrário o Senhor
doutor Chavier com ch era lagarto, lagarto, lagarto. Podia perdoar os devaneios
da Senha Doutora Dona Alzira – e perdoou; mas ao pulha que tem na alma a chama imensa (Ver nota
anterior) nem pensar! E tudo acabou em bem salvo para o ex
jardineiro: o Xavier com x foi à vida, seguiu para o presídio. O que o autor
não sabe se - como se passou com o Sócrates, - foi ao Pinheiro da Cruz
NOTAS
A – Este textículo não tem
nada que ver com «O
mistério da estrada de Sintra» da autoria dos Senhores Eça de Queiroz e Ramalho Ortigão. Se
assim fora, isso significava que o autor era uma besta quadrada
B – Muito menos
tem qualquer malévola intenção de se pensar que tem semelhança com o ex rei das
Águas e x presidente do Sporting clube de Portugal (SCP).
C – De repente,
sem saber porquê estava o autor no domingo passado refastela no sofá preferido
assistindo às aventuras do Morse e deu por si com vontade de voltar a escrever.
Parece, portanto que vou melhorando da maldita bipolar. Creio que o escrito
acima origina um pedido de desculpas aos que há quase um ano não se esqueceram
dele
Malditos fogos!
O autor tem obrigatoriamente de se referir aos
catastróficos incêndios que já causaram muitas vidas, localidades perdidas e
instalações industriais e comerciais. A todos aqui fica registada a minha solidariedade
que se dirigem a todos que têm combatido essa calamidade.