A mana (????)
do padre
Francisco
Antunes Ferreira
Vitorino Ximenes dos Santos montou-se
na bicicleta com que ia e vinha de casa para Gaia, onde se encontrava a
primeira fábrica de cortiça do Senhor Amorim na qual era operário, meteu os pés
nos pedais ajeitou o traseiro no selim e seguiu para Arcozelo onde vivia com os
pais e duas irmãs mais velhas do que ele, pois era o último da família, a que
os brasileiros chamavam caçula. Mas por que bulas diziam os brasucas caçula?
Metera aquela interrogação, na cachola e decidira fazer a pergunta ao ti
António que era um sabichão e vivia na praia da Aguda Tinha a certeza que o “Mocho”
– assim chamavam ao gajo porque dormia de dia e saía à noite para fazer a ronda
das tabernas e comer umas gajas fixes, muitas delas casadas, mas naturalmente
sem os respectivos …saberem, o corno é na verdade o último a saber – o
esclareceria.
Os
pais Santos tinham cinco filhos e nove filhas. (No futuro lá longe haveria uns
sacanas que diziam que eles não tinham televisão – daí a prole pois à noite o
casal entretinha-se na cama… Eram, portanto, especialistas em brincadeiras
entre lençóis, como manda a decência e a Santa Madre Igreja; e a mãe tinha uma
devoção à Nossa Senhora da Conceição. Mas conceições havia muitas e padre
Francisco que vivia com a irmã, justamente Maria da Conceição, até se chateava e
muito, quando ironicamente diziam: irmã(?????)
II Guerra Mundial |
Corria
o ano de 1939 - nascera em 18 de Fevereiro de 1923 - e tinha começado um
arraial de porrada entre os aliados e o eixo, assim a modos dum
Portugal-Espanha com muitíssimas mais galhetas. Era a Segunda Guerra Mundial.
Em Arcozelo não ligavam peva à cacetada. Por virtude da Nossa Senhora de Fátima
e também do Senhor Presidente do Concelho de Ministros, doutor António de
Oliveira Salazar, a guerra não chegava a Portugal que era neutral e muito menos
a Arcozelo onde o pessoal nem sequer conhecia a malta que andava à bordoada.
Por vezes, uns cidadãos, poucos, ouviam umas coisas sobre as batalhas na BBC
onde o senhor Fernando Pessa dava notícias todos os dias, mas o resto do
pessoal não ligava nem à rádio nem à guerra. Que se lixassem!
Praia da Aguda |
Vitorino
tinha dezasseis anos, mas começara a trabalhar quando saíra da escola em 1932.
Não, a família não era pobre, era mais para o lado da remediada, o pai era
marinheiro na praia da Aguda e a mãe era costureira em casa, mas para fora.
Sete das irmãs e os quatro filhos mais velhos já tinham saído do ninho, umas e
uns tinham casado no Mosteiro de Grijó onde fazia um frio do carago e quem lá
ia tinha de usar roupa de aconchego no Inverno, mesmo no pino do Verão tal era
frialdeza, que alguns até levavam sobretudo. Algumas tinham ficado solteiras à
espera de chegarem a tias solteironas.
Entrementes, das rolhas de
cortiça, o Vitorino queria transferir-se para a pesca, mas quer a mãe quer o
próprio pai lhe tinham dito que o mar era traiçoeiro, muito melhor era sentir
os pés apoiados na terra. Por isso, depois de ter começado por ajudante de
pedreiro, passara para uma mercearia, estava chateado de andar com cargas às
costas, o primo Luís arranjara-lhe um lugar na fábrica da cortiça. Era um
emprego bom, primeiro via os outros trabalhadores a cortar rolhas, ia aprendendo
e já era terceiro oficial.
Um
dia, o padre Francisco avisou as suas ovelhas que ia ser colocado na igreja de
São Bernardo, em Portalegre, e Vitorino que ia todos os domingos ia à missa
porque o dia do Senhor tinha ser respeitado - dizia a mãe Olinda, aproveitou o
ensejo e em vez de perguntar ao “Mocho” por que diabos os brasileiros diziam
caçula foi ao padre Francisco de malas já feitas pôr-lhe a pergunta. O
sacerdote dissera-lhe que do Brasil só conhecia a Carmen Miranda, que ainda por
cima era portuguesa. E o rapaz, mesmo sem ser marinheiro, ficara a ver navios. Na
verdade Vitorino acabara por ficar muito chateado. Mas regalou-se com um
pensamento: ele já tinha a bicicleta e o clérigo andava à pata. Resultado: 1-0.
daquelas fluorescentes |
Deixe-se
de seguir o Vitorino Ximenes dos Santos faça-se a linha para o mui digno cura,
que aliás nunca curara ninguém, mas isso eram negócios da Igreja de Roma, onde
o Santo Padre também não era muito afim de curas. Parece que essa especialidade
era da Senhora de Fátima, não desfazendo na Santa Conceição, que não metia o bedelho no tema. De resto, Fátima
era mais para a banda dos negócios dos terços, das velas, dos crucifixos, das
imagens, fluorescentes que luziam à noite sem serem ligadas às tomadas
de corrente; isso sim era um mistério dos verdadeiros. De resto, a Santa
Conceição estava muito conotada com o faça sol e chuva não, no Verão, e no Inverno trocavam-se as voltas como no vira.
Feira das cebolas |
O Padre Francisco com a irmã (????) chegados a
Portalegre foram em busca de casa já que a paróquia não tinha instalações para
o presbítero. Arranjaram uma na rua de Infantaria 22 que dava para a praça da
Corredoura e nas traseiras de várias habitações havia um pátio comum onde as
vizinhas coscuvilhavam diariamente. A casa de rés-do-chão e primeiro andar era
acolhedora e o padre Francisco maila sua mana (??????) sentiam-se porreiraços
nela. As manhãs de corte-e-costura
das vizinhas eram bem conhecidas. Nisso, ninguém levava a palma à Olinda
Pirolito |
Portalegre
estava (e está) situada nas fraldas da Serra de São Mamede, daí que dela venha
uma frialdade fod,… oops, lixada no Inverno e por vezes também no Verão, na
Primavera e no Outono. Os portalegrenses naquela altura usavam (e ainda agora
usam) muito as braseiras com as suas camilhas ou as lareiras em especial nas
cozinhas de tripés e caldeirões de ferro. Do outro lado da rua havia a fábrica
de pirolitos. Quando estoirava um deles toda a miudagem acorria para apanhar os
berlindes. Jogar ao bilas era entrenetimento, principalmente no sem piras são três.
eixo, ribaldeixo |
Aliás
as brincadeiras dos putos eram muito escassas. O bilas com abafador; o eixo ribaldeixo, caramelo ou pau do eixo, uma,
bruma, duas, batas cruas, três pulinhos holandeses, quatro, bolo de arroz faz o
pato, cinco, maria do brinco seis,. reis, sete vira a folha ao canivete, oito,
biscoito, nove, dá dez réis ao pobre, dez, comichão nos pés, onze, bronze,
doze, palmada, estás perdoado, três ,e meia bem cheia, catorze, atira o boné,
quinze, apanha bonés, se não fazes assim, perdes e serás o próximo a abaixar!
Cuscas |
O Padre Francisco com a irmã (????) chegados a
Portalegre foram em busca de casa já que a paróquia não tinha instalações para
o presbítero. Arranjaram uma na rua de Infantaria 22 que dava para a praça da
Corredoura e nas traseiras de várias habitações havia um pátio comum onde as
vizinhas coscuvilhavam diariamente. A casa de rés-do-chão e primeiro andar era
acolhedora e o padre Francisco maila sua mana (??????) sentiam-se porreiraços
nela. As manhãs de corte-e-costura
das vizinhas eram bem conhecidas. Nisso, ninguém levava a palma à Olinda
Epela sua situação geográfica é zona de trovoadas vindas da serra. Uma noite
houvera uma das grandes que até aterrorizaram as gentes. Os trovões e os
relâmpagos tinham sido constantes, só amainando um pouco já chegava a manhã. Só
então as vizinhas comentavam o temporal. A dona Pulquéria começara por dizer
que o medo dela e do seu homem levaram-nos a esconder-se debaixo da mesa da
sala de jantar. A Deolinda que era viúva refugiara-se por baixo da cama.
Todas
foram contando as peripécias nocturnas, umas mais amedrontadas do que outras,
uns discursos de lamurias, de cagaços até que chegou a vez da irmã (????) do
Padre Francisco: “Ai vizinhas apanhei um susto tão grande que, se não me agarro ao mano
Francisco, estive quase a cair da cama…” A confissão da mana (????) foi
como um maná caído do céu e deu aso a conversas para mais de um mês. “..se
não me agarro ao mano Francisco, estive quase a cair da cama…” correu
por toda a cidade e foi alvo de galhofa. Até na Serra de São Mamede...