2016-06-07


Da velhice
Antunes Ferreira


S
e mo permitem hoje vou dar uma de filosofia. Espantam-se? Duvidam? Franzem a testa? Deixem-se disso. Sendo assim hoje vou falar sobre a velhice. Temos de tomar em conta a informação estatística que diz que nos nossos países a média etária de um homem é 70 anos; mais do que isso – é tempo emprestado. De resto, a única coisa certa que temos na vida é a morte. O meu Amigo há pouco falecido Nicolau Breyner disse-me um dia que não tinha medo da morte, apenas tinha de não estar vivo…

T
odos (ou quase) sabemos quem foi o grande Vasco Santana; a sua figura inolvidável marcava um dos maiores cómicos portugueses. Era gordo – um dia para ir em trabalho ao Reino Unido e outros camaradas reportando a visita do PR Ramalho Eanes tive de alugar uma casaca no guarda-roupa Anahory; por isso no jantar de gala em  Buckingham tive de usar a do Vasco Santana…, mesmo assim com o colete descosido nas costas…
Vasco Santana


O
 Vasco também morreu, como todos os homens e as mulheres. Inevitável. Contou-me o filho Henrique também meu Amigo, que o pai quando já se encontrava nas vascas da morte estava deitado na cama dele, com os cortinados todos corridos dando à habitação um ambiente realmente soturno. O Ribeirinho chegou para o visitar (além de colegas eram também inseparáveis) e entrou no quarto- Pondo a mão em cima da do quase defunto, perguntou-lhe, então Vasco, como vais? E ele respondeu-lhe, de preto e de sapatos de polimento. Humor até na hora da morte.

M
as hoje aquilo que venho tratar é a velhice, não a morte. Muitos sujeitos de importância se pronunciaram sobre a velhice. Por exemplo o chinês (Lin Tu Tang 1895 – 1976) afirmou que “Na juventude a beleza é um acidente da natureza; na velhice é uma obra de arte” André Maurois disse que “A arte de envelhecer consiste em conservar a esperança” enquanto que Victor Hugo sentenciou “Nos olhos dos jovens vêem-se as chamas, mas é nos olhos dos mais velhos onde vemos a luz”. Termino com Stravinsky  “Depois de completar os 80 anos (ou estarmos perto) todo o contemporâneo é uma amigo!.

A
final o que é a velhice? De acordo com o Dicionário
O que é a velhice?
Conceito.de
“velhice á qualidade do que é velho (alguém de idade avançada ou algo antigo e que não é novo nem recente). M. de la Palice não diria melhor… mas continua a obra: A velhice faz referência à senilidade ou idade senil. Embora não exista uma idade exacta que se possa considerar como o começo da velhice, costuma-se dizer que uma pessoa é velha depois de passar a casa dos 70 anos”

B
asta de citações e transcrições: para mim a velhice é um estado de alma (se é que a alma existe, eu não acredito) conluiado com os ponteiros de um relógio analógico – mas também é uma chatice. Pensando bem nem somos (não sou…) assim tão velhos; o que acontece é que muita juventude acumulada. Claro que não temos de subir uma escada, se há elevador – sobretudo quando o nosso objectivo vive no décimo segundo andar, apartamento K esquerdo.

N
um passeio no Parque das Conchas e dos Lilases é que se descobre que a bengala é um artefacto que ajuda muito; pior são as muletas e ainda pior são as cadeirinhas de rodas; melhor só estas últimas motorizadas. Vamos ver: os velhos não podem jogar futebol muitos menos râguebi – nem por vezes assistir por mor dos encontrões e das pisadelas de outros espectadores mais distraídos ou mal-educados. Nem pensar no salto à vara, podem dar um trambolhão do ca… oops dos diabos.
Boa todos os dias


C
hinquilho nem é melhor falar; se tentam, acertam no parceiro que conta as pedras. Já damas, dominó ou xadrez podem desde que seja nos respectivos tabuleiros honny soit qui mal y pense e até o gamão em igual relvado, mas não se pense que se trata de um jogo em que se gama a carteira ou o porta-moedas do adversário e ele não usa bengala. Porém se passar uma mulheraça, boa todos os dias, podem segui-la com o olhar e devem gala-la porque olhar não é pecado. Velhos são os trapos diz a plebe.

T

odavia, todas as regras têm excepções; estou a caminho dos 75 aninhos, mas a cabeça vai pensando, as mãos vão escrevendo, conservo a memória q.b., os lóbulos cerebrais não me atraiçoam; correr é que é mais difícil, sexo já foste, mas já andei de paraceiling em Benaulin e sem temor à vista. Por isso penso que ainda me encontro dentro do prazo de validade. Penso… logo existo.