Da velhice
Antunes Ferreira
S
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e mo
permitem hoje vou dar uma de filosofia. Espantam-se? Duvidam? Franzem a testa?
Deixem-se disso. Sendo assim hoje vou falar sobre a velhice. Temos de tomar em
conta a informação estatística que diz que nos nossos países a média etária de
um homem é 70 anos; mais do que isso – é tempo emprestado. De resto, a única
coisa certa que temos na vida é a morte. O meu Amigo há pouco falecido Nicolau
Breyner disse-me um dia que não tinha medo da morte, apenas tinha de não estar
vivo…
T
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odos (ou
quase) sabemos quem foi o grande Vasco Santana; a sua figura inolvidável
marcava um dos maiores cómicos portugueses. Era gordo – um dia para ir em
trabalho ao Reino Unido e outros camaradas reportando a visita do PR Ramalho Eanes
tive de alugar uma casaca no guarda-roupa Anahory; por isso no jantar de gala em Buckingham tive de usar a do Vasco Santana…,
mesmo assim com o colete descosido nas costas…
Vasco Santana |
O
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Vasco também morreu, como todos os homens e as
mulheres. Inevitável. Contou-me o filho Henrique também meu Amigo, que o pai
quando já se encontrava nas vascas da morte estava deitado na cama dele, com os
cortinados todos corridos dando à habitação um ambiente realmente soturno. O
Ribeirinho chegou para o visitar (além de colegas eram também inseparáveis) e
entrou no quarto- Pondo a mão em cima da do quase defunto, perguntou-lhe, então
Vasco, como vais? E ele respondeu-lhe, de preto e de sapatos de polimento.
Humor até na hora da morte.
M
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as hoje
aquilo que venho tratar é a velhice, não a morte. Muitos sujeitos de
importância se pronunciaram sobre a velhice. Por exemplo o chinês (Lin Tu Tang
1895 – 1976) afirmou que “Na juventude a
beleza é um acidente da natureza; na velhice é uma obra de arte” André
Maurois disse que “A arte de envelhecer
consiste em conservar a esperança” enquanto que Victor Hugo sentenciou “Nos olhos dos jovens vêem-se as chamas, mas
é nos olhos dos mais velhos onde vemos a luz”. Termino com Stravinsky “Depois
de completar os 80 anos (ou estarmos perto) todo o contemporâneo é uma amigo!.
A
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final o que
é a velhice? De acordo com o Dicionário
Conceito.de “velhice á qualidade do que é velho (alguém
de idade avançada ou algo antigo e que não é novo nem recente). M. de la
Palice não diria melhor… mas continua a obra:
A velhice faz referência à senilidade ou idade senil. Embora não exista uma
idade exacta que se possa considerar como o começo da velhice, costuma-se dizer
que uma pessoa é velha depois de passar a casa dos 70 anos”
O que é a velhice? |
B
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asta de
citações e transcrições: para mim a velhice é um estado de alma (se é que a
alma existe, eu não acredito) conluiado com os ponteiros de um relógio
analógico – mas também é uma chatice. Pensando bem nem somos (não sou…) assim
tão velhos; o que acontece é que muita juventude acumulada. Claro que não temos
de subir uma escada, se há elevador – sobretudo quando o nosso objectivo vive
no décimo segundo andar, apartamento K esquerdo.
N
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um passeio
no Parque das Conchas e dos Lilases é que se descobre que a bengala é um
artefacto que ajuda muito; pior são as muletas e ainda pior são as cadeirinhas
de rodas; melhor só estas últimas motorizadas. Vamos ver: os velhos não podem
jogar futebol muitos menos râguebi – nem por vezes assistir por mor dos
encontrões e das pisadelas de outros espectadores mais distraídos ou mal-educados.
Nem pensar no salto à vara, podem dar um trambolhão do ca… oops dos diabos.
Boa todos os dias |
C
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hinquilho
nem é melhor falar; se tentam, acertam no parceiro que conta as pedras. Já
damas, dominó ou xadrez podem desde que seja nos respectivos tabuleiros honny soit qui mal y pense e até o gamão
em igual relvado, mas não se pense que se trata de um jogo em que se gama a carteira
ou o porta-moedas do adversário e ele não usa bengala. Porém se passar uma
mulheraça, boa todos os dias, podem segui-la com o olhar e devem gala-la porque
olhar não é pecado. Velhos são os trapos diz a plebe.
T
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odavia,
todas as regras têm excepções; estou a caminho dos 75 aninhos, mas a cabeça vai
pensando, as mãos vão escrevendo, conservo a memória q.b., os lóbulos cerebrais
não me atraiçoam; correr é que é mais difícil, sexo já foste, mas já andei de paraceiling em Benaulin e sem temor à
vista. Por isso penso que ainda me encontro dentro do prazo de validade. Penso…
logo existo.