Antunes Ferreira
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laro que é impossível pôr um polícia, um gendarme ou um
soldado atrás de cada cidadão. Poderá dizer-se que as armas oficiais são um
elemento de dissuasão, o que efectivamente é verdade, mas em muitos casos não
chega. Depois da brutalidade criminosa que se passou em Nice, mais precisamente
na Promenade des Anglais, e que
saldou (até à data em que escrevo este texto) por mais de oitenta mortos e duzentos
feridos, cinquenta em estado grave a França, naturalmente, vive em estado de
choque.
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intervenção do Presidente
François Hollande foi uma tentativa de aliviar a tensão em que se encontram os
seus compatriotas e não só. Mas, infelizmente não trouxe na verdade nada de
novo; de resto, que se esperaria mais? O prolongamento do estado de emergência
por mais três meses e o reforço dos elementos de segurança, e a continuação do
país através da Força Aérea no combate ao Daesh no Iraque e na Síria. Apenas um
pormenor se destaca entre estas medidas: a convocação de cidadãos antigos
militares para participar nessa enorme tentativa de assegurar a segurança. Caso
semelhante só é possível encontrar aquando das guerras mundiais.
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ra, esta mortandade horrível aconteceu quando vigorava o
estado de emergência e quando os serviços de segurança estavam na rua
preparados para possíveis ataques terroristas como os que se verificaram no
Charlie Hedbo, no ataque ao supermercado judeu e na carnificina do Bataclan.
Sendo assim, o apelo à calma e à serenidade de Hollande é muito importante, mas
não impede que permaneça, aliás justificadamente, o medo dos cidadãos que se
perguntam quando será que um novo ataque terrorista se verificará? Ao fim de três dias o auto-denominado "Estado Islâmico" através das redes sociais reivindicou a autoria do mortífero, chamando a Mohamed Lahouaiej Bouhlel um "soldado". Pode assim dizer-se que fazem o mal e a caramunha!
D
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esde a eliminação maciça dos judeus, ciganos, membros das oposições
e mais, que o Holocausto tem sido exemplo do que o homem pode fazer no domínio
do crime organizado. Auschwitz era o nome alemão dado a Oswiecim,
localidade na Baixa Polónia invadida pelos nazis. No campo que teve o seu nome,
terão sido gazeados e cremados mais de um milhão e seiscentos mil prisioneiros, em
especial judeus. Era a solução final
como Hitler tinha determinado.
O trabalho traz a felicidade... |
A
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o
longo de setenta e cinco anos tem vindo a ser classificado como o maior crime
cometido pelos homens. Tive a oportunidade de visitar o campo de concentração e
de extermínio. E no local senti-me revoltado, asfixiado, quase desmaiei, as
lágrimas chegaram-me aos olhos e compreendi o horror que o arame farpado, as
minas, as salas de gazeamentos, os crematórios representavam em confronto com a
liberdade. Ironicamente no portão do diabo estava escrito ARBEIT MACHT FREI, ou seja, O
TRABALHO TRAZ A LIBERDADE..
J
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ulguei
que a hecatombe criminosa e a loucura que a acompanhava não podiam ter coisa
semelhante. Mas, teve, infelizmente teve, como se viu no massacre de Srebenica,
no cerco de Sarajevo, nos bombardeamentos, nos fuzilamentos e nos novos campos de concentração as atrocidades cometidas durante a guerra civil na antiga
Jugoslávia já nos nossos tempos. Tal como o Kosovo as lutas eram raciais, mas, ironia
macabra, também fraternais.
O desnorte das pessoas |
E
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m Nice, face a momentos hediondos como este, que o desnorte
das pessoas é mais evidente. Já se sabe quem foi o assassino, já se sabem as
nacionalidades de muitos dos mortos e dos feridos, incluindo que entre estes
últimos há um Português. Perdoem-me a afirmação: este último pormenor pode ser
considerado peanuts, quando comparado
com a dimensão da tragédia. Com isto não quero dizer que a preocupação com a
vida de compatriota é de somenos importância; nada disso. O contrário seria
renegar a Pátria que vinha de uma vitória precisamente contra a França no
Europeu 2016. O que é que se diga que um não tem nada a ver com outro. Infelizmente
as coisas coincidiram, nada mais.
Entretanto dou por mim a inquirir-me por que bulas perante os
ataques terroristas a (des)União Europeia declara estar aterrorizada, mas não
faz nada. Não foi para isto que Jean Monet e Robert Schumann criaram os
fundamentos do Comecon, da CE, depois, CEE e finalmente (des)União Europeia. A
realidade é bem diferente: a Europa, continente velho, está amarrada e
amordaçada, perante o poder de uma Alemanha que no tempo de Hitler e da sua Wehrmacht falhou a conquista da Europa e hoje ajoelha perante Frau
Angela Merkel e Her Wolfgang Schäuble que o conseguiram através das finanças e da
economia o que significa o poder do dinheiro. Curiosamente a mesma Alemanha não foi vítima de qualquer ataque; porque será que isso acontece?
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lém disso pergunto-me uma outra vez que é feito da
(des)União Europeia em matéria absolutamente necessária de defesa em
ocorrências como esta? Trocas de informações entre os países que ainda estão
integrados nela? Forças policiais e militares conjuntas, o que quer dizer
europeias? A realidade é que os países europeus, sejam ou não participantes na
(des)EU, estão impotentes contra estes morticínios horrendos.
Marcelo deu condolências |
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estam as condolências e as declarações de solidariedade dos
políticos. Até agora na Europa há que registar (e porque oriundos da nossa
casa) Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa; Papa Francisco, Theresa May, nova
primeira-ministra do Reino (des)Unido, Mariano Rajoy, Charles Michel,
primeiro-ministro da Bélgica, Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu e
outros. Fora da Europa, Barak Obama, presidente dos EUA, Justin Trudeau,
primeiro-ministro do Canadá, Michel Temer, presidente em exercício do Brasil,
Juan Carlos Varela, presidente do Panamá etc.
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o entanto, todas estas declarações não passam disso mesmo –
declarações de intenção. Representam, é certo, o pesar e a solidariedade de quem está de fora. Acontece, porém, que no caso vertente não são de todo pieguice ou esmola, que pode servir de alguma consolação para a França, mas
não restitui a vida aos mortos nem a saúde aos feridos.
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Texto actualizado
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Texto actualizado
Também
publicado no “Sorumbático” e no” A Zorra da Boavista”