Ai os verbo
Antunes Ferreira
Uma sugestão do meu grande amigo «anónimo/Seixas da Costa(1)»
é uma ordem para mim. Diz-me que devo escrever porque os longos que
habitualmente faço, afastam os que ainda me leem. Por isso aqui vai.
A cena passa-se em Luanda nos tempos da guerra colonial (a
que o ditador de Santa Comba crismou de “ultramarina”) e quando o professor Sebastião
entra na sala de aulas da primária para alunos entre os doze e catorze anos. Tão só uma advertência: a linguagem utilizada é, tão aproximada quanto possível da que era praticada pelos naturais negros sem grande estrato cultural. Não há aqui qualquer resquício de apartheid.
«Hoje, vamo dar os verbo, que é aquele coisa que usamo quando
vamo na loja do branco sôr Faustino comprar um quilo de fuba para fazer
o funje. Entenderam?»
A turma inteira: «Sim, professor!» Então, o Sebastião
aponta o Carlos: «Diz um verbo?» «Biscreta.» Ouve minino, não é biscreta, é bi
ci cre ta, e é um sustantivo»
«E tu, Calomo, dá-me um verbo?» O Calomo respira fundo: «Prástico»
Sebastião vai os arames: «Prástico é aquilo pra fabricar alguidares, carrinhos
no Jumbo, frascos da farmácia – mas tamém é um sustantivo! Fogo!»
Finamente e em desespero, o professor aponta com o ponteiro
para o Miquelino: «Se não me dás um verbo, mando cortar-te os tomates!!!» Miquelino
empertiga-se: «Hospedar!» Sebastião rejubila: «Isto sim, isto é um verbo; faz
uma frase com esse verbo, por favor…»
Miquelino pigarreia e atira: «Os pedar da minha biscreta
são de prástico!...»
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(1)
Ele não precisa, mas é o Seixas da Costa