2023-08-28

 

Ai os verbo

 

Antunes Ferreira

Uma sugestão do meu grande amigo «anónimo/Seixas da Costa(1)» é uma ordem para mim. Diz-me que devo escrever porque os longos que habitualmente faço, afastam os que ainda me leem. Por isso aqui vai.

A cena passa-se em Luanda nos tempos da guerra colonial (a que o ditador de Santa Comba crismou de “ultramarina”) e quando o professor Sebastião entra na sala de aulas da primária para alunos entre os doze e catorze anos. Tão só uma advertência: a linguagem utilizada é, tão aproximada quanto possível da que era praticada pelos naturais negros sem grande estrato cultural. Não há aqui qualquer resquício de apartheid.  

«Hoje, vamo dar os verbo, que é aquele coisa que usamo quando vamo na loja do branco sôr Faustino comprar um quilo de fuba para fazer o funje. Entenderam?»

A turma inteira: «Sim, professor!» Então, o Sebastião aponta o Carlos: «Diz um verbo?» «Biscreta.» Ouve minino, não é biscreta, é bi ci cre ta, e é um sustantivo»

«E tu, Calomo, dá-me um verbo?» O Calomo respira fundo: «Prástico» Sebastião vai os arames: «Prástico é aquilo pra fabricar alguidares, carrinhos no Jumbo, frascos da farmácia – mas tamém é um sustantivo! Fogo!»

Finamente e em desespero, o professor aponta com o ponteiro para o Miquelino: «Se não me dás um verbo, mando cortar-te os tomates!!!» Miquelino empertiga-se: «Hospedar!» Sebastião rejubila: «Isto sim, isto é um verbo; faz uma frase com esse verbo, por favor…»

Miquelino pigarreia e atira: «Os pedar da minha biscreta são de prástico!...»

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(1)
Ele não precisa, mas é o Seixas da Costa