2016-08-23

PENSAMENTOS DE UM MÉDICO
Começamos hoje a publicar textos da autoria de Francisco Crespo, médico, meu colega até ao 5º ano do Liceu Camões e meu grande Amigo. Obrigado Xico. O escrito é “datado” mas tem de se compreender que não é de ontem. É de um “ontem” especial. A inserção dos artigos não terá regularidade: sempre que apareçam serão publicados. A NOSSA TRAVESSA fica enriquecida com esta colaboração e espera que as leitoras e os leitores a sigam com agrado. Muito obrigado. AF


As alternativas mais sérias

Francisco Crespo (*)

H
oje sábado ultimo dia de tamanho normal, antecâmara da maior noite do ano, aconteceu-me ter folga dos netos, para ir com o pensamento de mão dada, caminhando...

O Liceu Camões

N
a ausência dos ruídos, na “solidão aparente”, porque hoje a creche ficou por Lisboa. Como é hábito as companhias de sempre e novas vieram comigo... Ontem tive um jantar do meu curso do Liceu Camões. Foi um encontro excelente com os ex putos , em particular os que durante 7 anos regularmente saíamos do liceu, fazíamos uma paragem numa livraria perto do Saldanha (Liv. Cultura ), onde depositávamos as pastas no chão para continuarmos as “discussões” das vésperas( íamos discutindo o Universo ...)


H
avia de tudo, um comunista oculto, um monárquico de esquerda, um de extrema direita, um conservador mas não reaccionário, um progressista não amarrado, um mais calado que ainda não nos disse por onde voava e eu. Todos católicos menos o comunista.
Cultura ao Saldanha
O de direita temia que o pai fosse pendurado num candeeiro, se houvesse uma revolução (após o 25 de Abril telefonei-lhe ...não foi pendurado). Isto passava-se perto da casa do Marcelo Caetano, então Ministro de Salazar e tinha um policia à porta...  O dono da livraria pedia para termos cuidado...


C
uriosamente nenhum de nós mudou (eu perdi o Deus pelo caminho) e quando ontem lhes disse que tinha saudades de quando “discutíamos todo o Universo” um dizia –“ era isso! Hoje nem os crescidos confrontam ideias, olhem a estupidez com as intolerâncias por causa do Saramago”. Desta malta, dois somos médicos, dois professores universitários, um advogado, um militar e um licenciado em Direito. (Quase todos barrigudos...)


A
ssim recordando as discussões/reflexões, parti cismando sobre o Deus criador ou criado pelo homem? Dei comigo a pensar como é isto? O nada orgânico não existe. Será? Umm! Uma coisa é certa, anticlerical sempre fui e mantenho-me. Os Santos continuam lá, mas com os vendilhões do Templo sempre por perto do poder temporal... até tantas vezes contra os santos. Sou uma coisa estanha, cristão mas ateu! Para já…
O Ku Klux Klan


D
esde aquele tempo em que putos de calções, não tínhamos T.V., na América o Ku Klux Klan matava pretos,  a maioria das mulheres eram “escravas” de tudo,  não havia divórcio, as mulheres casadas só podiam sair do país com autorização do marido, havia a PIDE e deportavam-se políticos para o Tarrafal onde muitos morreram, havia o colonialismo...


H
oje os jovens dominam os computadores e é um ganho incrível, mas a sociedade desumanizou–se, desapareceu o amadorismo no desporto, a livre escolha das profissões, o convívio das gentes, o amor passou a posse, os bairros com jardins e lojinhas murcharam, a senhora Maria e o senhor Manel passaram a utentes, a fruta perdeu sabor e cheiro..., mas outro mundo nasceu, A China e Índia com um terço da população do mundo deslocaram o centro do poder.


T
udo tem que ser revisto para que o homem, (todo o homem!) seja o centro dos projectos colectivos, seja livre e tenha gosto de viver. É este repto para a revisão repartida com os jovens de todas as culturas que sendo difícil é aliciante. Sai ontem daquele jantar meditando se a minha geração terá ainda capacidade para participar saudavelmente nesta aventura que é a revisão quotidiana dos projectos da humanidade. 
Sem legenda



O
s radicalismos que ao longo de séculos dividiram e continuam a dividir os homens (católicos romanos, ortodoxos, protestantes, judeus, muçulmanos, ismaelitas, budistas, maçons, facções politicas...) têm de ser ultrapassados... Aquilo que para a minha adolescência foi a ética, a solidariedade, a reflexão prévia das opções, a defesa da liberdade, a convivência com os outros, entrou em “coma”. Temos ciência e poesia para a mudança?   


E
u continuo diariamente desassossegado, sonhando com esperança e uma pitada de utopia, é que a vida é um caminho solidário. Isoladamente nada se faz e nunca acabamos os projectos que arrastamos, outros os continuarão, pois o tempo de uma vida não chega... Assim decorre a história dos homens, com os jovens a renovarem-na. Eu tenho uma certeza, os anos que me faltam já são insuficientes para os meus projectos, o que não é grave porque outros os remodelarão, com um aviso, tudo tem de mudar na escolha dos políticos, as minorias não podem continuar a pagar as campanhas, para sufocarem as maiorias Temos de encontrar as alternativas mais sérias.
(*) Médico